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Contaminação da Água Mineral por Glifosato: Flexibilização, omissão e descompromisso.

Ao comprar uma garrafa de água mineral, você já se perguntou o que há dentro dela? Se a resposta for não, ou talvez já se perguntou e não sabia quais fontes procurar para saber disso, esse artigo de hoje foi escrito para tratar a respeito.

Pois bem, se você reparar no rótulo da sua garrafa, poderá notar que nele há escrito uma espécie de “tabela nutricional”. Essa tabela traz a composição química da água contida na garrafa, geralmente apresentando 9 elementos, sendo eles cálcio, magnésio, potássio, sódio, sulfato, bicarbonato, fluoreto, nitrato e cloreto e também características físicas e químicas da água na fonte de onde foi extraída, como pH, condutividade elétrica, temperatura e sólidos totais.

Mas aí surgem outras perguntas, quem é que regula isso tudo? Esses valores, são os que realmente estão na água da minha garrafa ou foi de uma amostragem há três anos atrás?

Toda água mineral para ser explorada precisa antes de tudo de uma licença do Departamento Nacional de Produção Mineral, um órgão ligado ao Ministério de Minas e Energia, se você olhar agora no rótulo de sua garrafa, em algum lugar terá o número de autorização de lavra, o alvará da empresa e o laboratório onde foram feitas as análises químicas, e que deveriam ser do acesso de todos, afim de garantir que o produto ofertado é de boa procedência.

Para obter a lavraria e a renovação da concessão, uma empresa de água mineral recebe, a cada três anos (sim, a cada TRÊS anos), a visita dos funcionários do Laboratório de Análises Minerais (Lamin) da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM). Os resultados das análises são comunicados à empresa e ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) , entretanto não disponibilizam para o público. Por que?

Uma parte do processo regulatório já foi entendido, mas e a outra que define quais são os valores máximos e mínimos destes parâmetros físicos e químicos? O órgão responsável por essa etapa é a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a qual por meio da resolução RDC nº 274, de 22 de setembro de 2005, orienta, regula e inspeciona o processo de produção visando a qualidade do produto final.

Esta resolução fornece uma tabela, que apresenta as concentrações dos limites máximos permitidos de substâncias químicas que representam risco à saúde. Não cabe aqui listar todas, nem muito menos discuti-las, mas um ponto que me chamou a atenção foi o valor excessivamente alto de 0,5 mg/L permitido de glifosato.

O glifosato é um herbicida amplamente utilizado no mundo todo para o controle de plantas daninhas nos mais diversos ambientes. Não irei esmiuçar suas características químicas, suas formas de aplicação e seus mecanismos de ação, mas acho importante ressaltar sobre a sua toxicidade.

Mas antes disso é bom definir o que é a Dose Letal 50 (DL50). A dose letal 50 é uma forma de expressar o grau de toxicidade aguda de um produto. Indica a quantidade de ingrediente ativo de uma substância tóxica (como agrotóxico) necessária para matar 50% de animais testados.

A DL 50 do glifosato é considerada baixa, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, o DL50 oral do glifosato puro em ratos é de 4.230 mg/kg. Essa toxicidade relativamente baixa se deve à modalidade bioquímica de ação do glifosato em um caminho metabólico nas plantas (chamado mecanismo do ácido “shikimico”) que não existe em animais.

Mas embora a toxicidade aguda do glifosato seja considerada baixa, o herbicida pode causar defeitos crônicos de nascimento em determinadas espécies de animais, quando administrado em doses elevadas e por um período prolongado. A dose diária aceitável por massa corpórea deste composto é de 0,05 mg.Kg. Apenas para comparar a Comunidade Econômica Européia (EEC) estabelece como “concentração máxima admissível” para pesticidas em água potável, como substâncias individuais, o limite de 0,0001 mg/L, um valor muito menor do permitido no Brasil.

Minha pergunta é por que a legislação brasileira é tão “flexível”, com amostragens feitas cada três anos e sem disponibilizar os documentos que comprovem que a água é livre destes contaminantes? É triste dizer isso, mas penso eu que sendo o Brasil o maior mercado consumidor de agrotóxico do mundo, não haveria água possível de ser consumida com padrões tão rígidos.

Esse foi o caminho adotado no Brasil, flexibilizar as leis afim de fantasiosamente amenizar os efeitos e não tratar as causas. Já existem inúmeras evidências que demonstram a contaminação dos aquíferos brasileiros por glifosato e outros pesticidas, seus efeitos crônicos nos humanos e seus impactos no meio ambiente, mas ainda assim insistimos em manter o modelo irresponsável de produção de alimentos atual, fazendo a perversa barganha da lucratividade em detrimento da da simples confiança em poder tomar um copo de água.

 

Obs: O valor antes mencionado de 500 mg/L estava incorreto, sendo na verdade 0,5 mg/L.

Sugiro a leitura do artigo "Da pra Beber essa Água?" no link: http://apublica.org/2014/03/da-para-beber-essa-agua/​

Referências:

Departamento Nacional de Produção Mineral. O passo a passo para explorar água mineral. Acesso em: http://www.dnpm.gov.br/assuntos/ao-publico/paginas/explorar-agua-mineral-veja-como-e-facil. 2015.

Vigna, A. Da pra beber essa água?. Acesso em: http://apublica.org/2014/03/da-para-beber-essa-agua/. 2014.

ANVISA. Resolução RDC nº 274 REGULAMENTO TÉCNICO PARA ÁGUAS ENVASADAS E GELO. 2002.

Amarante, O. P. J; et. al. GLIFOSATO: PROPRIEDADES, TOXICIDADE, USOS E LEGISLAÇÃO. Quim. Nova. Vol. 25. No. 4. Pg. 589-593. 2002.

Santos, J. C. A fragilidade da Anvisa e o uso indiscriminado de agrotóxicos no Brasil. Entrevista especial com Victor Manoel Pelaez Alvarez. Acesso em http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/fragilidade-da-anvisa-e-o-uso-indiscriminado-de-agrotoxicos-no-brasil-entrevista-especial-com-victor-manoel-pelaez-alvarez/539242-fragilidade-da-anvisa-e-o-uso-indiscriminado-de-agrotoxicos-no-brasil-entrevista-especial-com-victor-manoel-pelaez-alvarez. 2015.

Seidel, C. Aquífero Guarani já está contaminado com Agrotóxicos. Acesso em: http://www.diarioriodopeixe.com/colunistas/charles-seidel/1310-aquifero-guarani-ja-esta-contaminado-com-agrotoxicos. 2015.


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